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Amizade Perdão

Era uma vez um jardim

Era uma vez um jardim. O colorido das alamedas abrigava espécies variadas de pétalas, botões e corolas. Cada flor disputava a primazia de seu valor e beleza. A rosa dizia:

– Fui eleita a mais bela das flores! A preferida dos artistas. Eles pintam ramalhetes da minha silhueta e os expõem em museus. Tenho muitas roupagens de cores.

As outras flores baixaram as corolas admitindo. E a rosa continuou toda cheia de si.

– Além de visitar mansões e templos, palácios e campos santos, minha fragrância é inigualável. Quilos e quilos de pétalas são usados para a essência, por exemplo, da Fragonar, em Nice na França e outros grandes centros de parfumerie, com seus famosos narizes. – Ela é a base dos mais refinados perfumes, continuou.

– Verdade, disse uma papoula de pétalas diáfanas. Mas não esqueça do que faz a beleza das amplas campinas francesas! Os turistas tanto apreciam que fotografam os campos. Apareço até iluminando um quadro de Van Gogh.

Estavam nesse diálogo, quando um singelo antúrio se intrometeu na conversa:

– Além disso, amiga rosa, não tenho notícia de nenhum elixir de sua substâncias para alívio de dores ..!! E quantos medicamentos não são extraídos do ópio da papoula? A rosa baixou a cabeça.

– Sim. É verdade. Antúrio! É verdade, papoula! Vocês têm seu valor como cada um de nós!!  Disse a rosa encabulada. Admito que me excedi. Deve ser esse calor de primavera. Perdoem-me. Não quero ser mal vista. Pensando bem a amizade de vocês é o que me importa. E um lírio bem tímido, balançou a cabeça, confirmando. E de repente se arrependeu do atrevimento. Não devia ter se manifestado. Se sentiu imprudente e disse baixinho:

– Desculpe. Ele mesmo não sabia de onde tinha saído tanta coragem…

– Sim! Sim! Sim! Sim! Estás perdoada, amiga rosa!! Exclamaram ao mesmo tempo glicínias, hibiscos, dálias, gérberas e orquídeas. Estavam envaidecidas de participarem da conversa. E a auto estima delas inflamou outras flores pequeninas como o mimo do céu, a boa noite, a nove horas, a sálvia, o cravo, todos exultantes, avivando tanto seu colorido à luz do sol que um pintor, saindo ao jardim exclamou:

 – Que lindo dia de primavera! Que floração exuberante! Que viço! Daria um belo quadro! Não posso perder esse momento! E pensando assim, foi correndo buscar a palheta de tinta e o cavalete com a tela…

Ao voltar sua silhueta foi aureolada das florzinhas da ricaçulina, que acabou derramando uma chuva rosa sobre seus cabelos. Chamada também trepadeira-sete-léguas, ela tinha se enroscado nas colunas ao lado no portal da casa, formando uma bela guirlanda florida em tom sobre tom.

Ao atentarem para toda aquela alegria, até uns nenúfares num pequeno laguinho saltaram um botãozinho mais vivo, indo se juntar a uma flor de lotus fazendo pose!

Vendo o cavalete do pintor as flores combinaram lançar um jato de perfume que deixou o artista inebriado. Cambaleando um pouco ele alcançou a tela para ajeitá-la sobre o cavalete de madeira. Procurou um espaço em que pudesse ver iluminadas as flores com a luz vermelha do fim de tarde. E suspirou animado….”Será minha obra-prima!” Estavam nisso quando um  pequeno beija flor pairou diante de um gladíolo, introduzindo o biquinho bem no fundo do cone azulado de suas pétalas.  Perfeito! pensou. Mas o passarinho após sugar a substância melíflua esvoaçou satisfeito. E o artista, virando-se para o jardim pensou:

– Por isso gosto de vocês minhas flores! Suas pétalas só esvoaçam com o vento. Posso pintá-las em repouso.

Coleção (Brincando no jardim da vovó)

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