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Altruísmo Amizade Empatia

Laurita Buscapé e Zezinho pinga-fogo

Zezinho e Laurita arengavam muito

– Seu laço está torto, criticava ele.

– Sua camisa está amarrotada, implicava ela.

Por isso os colegas apelidaram os dois de Zezinho pinga-fogo e Laurita cospe brasa. Mas isso foi depois.

Desde o começo do ano escolar, frequentavam a mesma escola, mas não sabiam. Eram vizinhos da mesma região, mas não sabiam. Os pais dos dois moravam em casas de campo, isoladas.

Uma vez dia na cidade, Laura pisou sem querer na lama na coxia, que salpicou na meia de Zezinho. Nem pensou em pedir desculpa, nem o menino pensou em desculpar, se arreliou e puxou o laço de uma trança dela. – Pinga-fogo! Berrou a menina. – Cospe brasa! gritou o menino. Assim começaram a brigar antes mesmo de saberem o nome um do outro.

Um dia, ao saírem da escola por acaso se encontraram – Então você estuda aqui?? Perguntou Laurita, indignada.

-Ah! Vou sair dessa escola, reagiu ele!

– Que azar estudar na mesma escola que você!!! Respondeu ela. E seguiram pelo mesmo caminho:

– Você está me seguindo?  Encrenqueira!

– Estou indo para casa! Disse ela.

– Ah, então vou pedir ao meu pai pra gente se mudar daqui!  Meu pai é pedreiro e encanador e tem freguesia na região. E Chutou de raiva, um cão que se aquecia ao sol.

– Meu pai é bombeiro e responsável em apagar os incêndios do local, disse ela e, de raiva, queimou com o olhar a asa de um passarinho que roubara a minhoca para os filhotes do outro.

-Meu pai é conhecido em toda a região, disse ele. E chamuscou com o olhar o rabo de um gato perseguindo um pequeno rato.

Na escola o bebedouro não estava funcionando. As crianças passavam sede. Tinha estourado um cano da instalação. Chamaram o Sr. Zezinho, o encanador e num instante estava tudo consertado.  Zezinho ficou orgulhoso. Um dia deu um curto-circuito na sala de aula, causando um fogaréu sobre as cadeiras. Sr. Lauro, o bombeiro, debelou o fogo num instante. Laurita ficou envaidecida.

Um dia a cidade de Encrencópolis acordou com um estrondo. O vulcão Espalha-fumo tinha entrado em erupção. As lavas escorriam pelos lados destruindo as casas próximas, mas felizmente não vitimou ninguém. Era de manhã. Os habitantes tinham saído pra trabalhar. Os que tinham casa ofereciam hospedagem aos desabrigados. Laurita e Zezinho, comovidos, dividiram cordialmente seus dormitórios, camas e brinquedos. Estavam felizes com tantos amiguinhos pra brincar. Percebendo o valor da amizade, agora só se tratavam com carinho:

– Queres um biscoito, Laurita?

– Sim, obrigada, Zezinho. Tome essa maçã.

A cidade passou a se chamar Alegrópolis e o vulcão, esse, fechou suas narinas chamejantes ali e foi fumar numa região desabitada. E nas suas encostas nasceram florezinhas lindas que os camponeses vendiam na feira aos domingos. E todos foram amigos para sempre.

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Amizade Perdão

Era uma vez um jardim

Era uma vez um jardim. O colorido das alamedas abrigava espécies variadas de pétalas, botões e corolas. Cada flor disputava a primazia de seu valor e beleza. A rosa dizia:

– Fui eleita a mais bela das flores! A preferida dos artistas. Eles pintam ramalhetes da minha silhueta e os expõem em museus. Tenho muitas roupagens de cores.

As outras flores baixaram as corolas admitindo. E a rosa continuou toda cheia de si.

– Além de visitar mansões e templos, palácios e campos santos, minha fragrância é inigualável. Quilos e quilos de pétalas são usados para a essência, por exemplo, da Fragonar, em Nice na França e outros grandes centros de parfumerie, com seus famosos narizes. – Ela é a base dos mais refinados perfumes, continuou.

– Verdade, disse uma papoula de pétalas diáfanas. Mas não esqueça do que faz a beleza das amplas campinas francesas! Os turistas tanto apreciam que fotografam os campos. Apareço até iluminando um quadro de Van Gogh.

Estavam nesse diálogo, quando um singelo antúrio se intrometeu na conversa:

– Além disso, amiga rosa, não tenho notícia de nenhum elixir de sua substâncias para alívio de dores ..!! E quantos medicamentos não são extraídos do ópio da papoula? A rosa baixou a cabeça.

– Sim. É verdade. Antúrio! É verdade, papoula! Vocês têm seu valor como cada um de nós!!  Disse a rosa encabulada. Admito que me excedi. Deve ser esse calor de primavera. Perdoem-me. Não quero ser mal vista. Pensando bem a amizade de vocês é o que me importa. E um lírio bem tímido, balançou a cabeça, confirmando. E de repente se arrependeu do atrevimento. Não devia ter se manifestado. Se sentiu imprudente e disse baixinho:

– Desculpe. Ele mesmo não sabia de onde tinha saído tanta coragem…

– Sim! Sim! Sim! Sim! Estás perdoada, amiga rosa!! Exclamaram ao mesmo tempo glicínias, hibiscos, dálias, gérberas e orquídeas. Estavam envaidecidas de participarem da conversa. E a auto estima delas inflamou outras flores pequeninas como o mimo do céu, a boa noite, a nove horas, a sálvia, o cravo, todos exultantes, avivando tanto seu colorido à luz do sol que um pintor, saindo ao jardim exclamou:

 – Que lindo dia de primavera! Que floração exuberante! Que viço! Daria um belo quadro! Não posso perder esse momento! E pensando assim, foi correndo buscar a palheta de tinta e o cavalete com a tela…

Ao voltar sua silhueta foi aureolada das florzinhas da ricaçulina, que acabou derramando uma chuva rosa sobre seus cabelos. Chamada também trepadeira-sete-léguas, ela tinha se enroscado nas colunas ao lado no portal da casa, formando uma bela guirlanda florida em tom sobre tom.

Ao atentarem para toda aquela alegria, até uns nenúfares num pequeno laguinho saltaram um botãozinho mais vivo, indo se juntar a uma flor de lotus fazendo pose!

Vendo o cavalete do pintor as flores combinaram lançar um jato de perfume que deixou o artista inebriado. Cambaleando um pouco ele alcançou a tela para ajeitá-la sobre o cavalete de madeira. Procurou um espaço em que pudesse ver iluminadas as flores com a luz vermelha do fim de tarde. E suspirou animado….”Será minha obra-prima!” Estavam nisso quando um  pequeno beija flor pairou diante de um gladíolo, introduzindo o biquinho bem no fundo do cone azulado de suas pétalas.  Perfeito! pensou. Mas o passarinho após sugar a substância melíflua esvoaçou satisfeito. E o artista, virando-se para o jardim pensou:

– Por isso gosto de vocês minhas flores! Suas pétalas só esvoaçam com o vento. Posso pintá-las em repouso.

Coleção (Brincando no jardim da vovó)